Poeta de origem moçambicana, viveu em Moçambique até 1975. Em Londres, desempenhou as funções de conselheiro de imprensa na Embaixada de Portugal. Em Moçambique participou activamente na vida cultural, quer como organizador e animador de suplementos literários da imprensa local, quer como crítico literário ou cinematográfico, tendo, por outro lado, marcado, com as quatro colectâneas poéticas que publicou entre 1959 e 1972, os caminhos da poesia moçambicana. A sua obra foi, nos últimos anos, um importante ponto de referência para as novas gerações no seu espaço de origem. (…)
(…) O seu, é no espaço lusófono, um dos casos mais nítidos de binacionalidade literária, pois há que considerá-lo tanto no âmbito da literatura moçambicana como no da literatura portuguesa. Knopfli é, de resto, desde o princípio, um ser culturalmente dividido entre as suas inegáveis raízes culturais europeias e o irrecusável apelo de uma África que não é menos sua e que, afinal, traz bem fundo “no sangue”. (…)
(…) A poesia de Knopfli, ao mesmo tempo que se insere na tradição lírica portuguesa moderna, abre-se, em fidelidade a uma forte aspiração cosmopolita, aos estímulos de outras tradições, particularmente aos da poesia de língua inglesa, sendo ainda de realçar que os interesses culturais que ela reflecte se ampliam ao cinema e à música, aqui com relevo para o jazz. (…)
O Livro Fechado
Quebrada a vara, fechei o livro
e não será por incúria ou descuido
que algumas páginas se reabram
e os mesmos fantasmas me visitem.
Fechei o livro, Senhor, fechei-o,
mas os mortos e a sua memória,
os vivos e sua presença podem mais
que o álcool de todos os esquecimentos.
Abjurado, recusei-o e cumpro,
na gangrena do corpo que me coube,
em lugar que lhe não compete,
o dia a dia de um destino tolerado.
Na raça de estranhos em que mudei,
é entre estranhos da mesma raça
que, dissimulado e obediente, o sofro.
Aventureiro, ou não, servidor apenas
de qualquer missão remota ao sol poente,
em amanuense me tornei do horizonte
severo e restrito que me não pertence,
lavrador vergado sobre solo alheio
onde não cai, nem vinga, desmobilizada,
a sombra elíptica do guerreiro.
Fechei o livro, calei todas as vozes,
contas de longe cobradas em nada.
Fale, somente, o silêncio que lhes sucede.
sábado, 6 de junho de 2009
RUI KNOPFLY (1932-1999)
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