Embora cultor de géneros vários, como a crónica o “diário inventado”, a narrativa de carácter memorialístico ou ficcional, o texto dramático breve, José Gomes Ferreira destacou-se sobretudo como poeta. Como “poeta militante”, assim havia de ficar conhecido, apesar de nem toda a sua produção poética se poder situar na linha da poesia dita de “intervenção”. Habitualmente conotado com o Neo - Realismo, cujos pressupostos teóricos lhe seriam caros, não é propriamente um escritor dessa geração, mais nova em idade; mas também não poderá ser incluído, sem reservas, na Presença, a geração que cronologicamente lhe corresponderia, como nos recorda João Gaspar Simões. Se é certo que, a dada altura do seu percurso, o poeta revê processos líricos anteriores, de cariz mais intimista e neo – romântico, mostra preocupações convergentes com as do movimento neo – realista (…)
(…) É ainda formado no magistério literário de Raul Brandão, o autor de Os Pobres, o escritor que olhou revoltado, mas enternecidamente, para os pobres e miseráveis deste mundo – mesmo antes de o Neo-Realismo fazer deles o tema preferencial ( a bem dizer, único) da sua produção literária – por quem nutre uma profunda admiração. Assim, conquanto se declare, em A Memória das Palavras, simpatizante de “tudo o que cheirasse a vanguardismo e modernidade”, não é a primeira geração modernista que o atrai, mas “o genial poeta de A Farsa, de Os Pobres e do Húmus, em que os componentes do grupo ( o seu grupo de amigos de juventude) encontravam não só o Espanto, a Caricatura, o Absurdo, o Desumano e o desvario do planeta circundante mas também a Fraternidade e a Revolução Inverosímil imanente”.
Desde os seus primeiros poemas, apesar de estes evidenciarem um lirismo mais centrado no eu individual, começa a esboçar-se a concepção do poeta como alguém que se sabe com uma missão a cumprir no mundo e de que o outro que com ele no quotidiano se cruza teria de ser o beneficiário. Daí a manifesta responsabilidade para com o homem, seu semelhante, e, não raro, a expressão de um sentimento de culpa ou remorso pelos males alheios ou o dedo acusador apontado não só à sociedade (…)
(…) José Gomes Ferreira deixa de ver na evolução o quadro estereotipado de flores, passarinhos e águas tranquilas, para a metaforizar em agressividade e protesto ou a culpabilizar pela impassibilidade ante o sofrimento alheio. Deixou de si a imagem de escritor crítico, inconformado e lúcido, de uma lucidez também revelada no modo como vigia a sua própria escrita e se autocensura.
CHOVE!
Chove...
Mas isso que importa!,
se estou aqui abrigado nesta porta
a ouvir a chuva que cai do céu
uma melodia de silêncio
que ninguém mais ouve
senão eu?
Chove...
Mas é do destino
de quem ama
ouvir um violino
até na lama.
sábado, 6 de junho de 2009
JOSÉ GOMES FERREIRA (1900-1985)
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