Poeta e ensaísta português licenciado em Ciências Matemáticas e durante décadas compulsivo professor particular e doméstico, exerceu a seguir, desde 25 de Abril de 1974 até à aposentação, as funções de professor da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra.
Não tem sido fácil conjugar a obra poética com o ensaísmo e a intensa actividade cultural deste autor. Como poeta, alinhou desde a primeira hora nas hostes do neo – realismo (…) até desaguar em formulações próximas do surrealismo (…)
(…) Porém, a obra de crítica e ensaio e a militância cultural e cívica desenvolvem – teoricamente, uma; em acto, a outra – uma demarcação do modernismo, aceite em algumas das suas premissas ou das suas consequências, mas contestado nas suas consequências sociais e políticas.
(…)Joaquim Namorado encontra uma via a seguir porque aí confirma que a poesia vivifica-se bebendo nas águas da lírica popular: ”A arte popular não é uma via de evasão, mas uma fonte inspiradora, um meio de conhecer e atingir as verdadeiras raízes do popular, o seu carácter autêntico, a sua concepção de vida e de mundo, os seus anseios e a sua luta.” (…)
PORT-WINE
O Douro é um rio de vinho
que tem a foz em Liverpool e em Londres
e em Nova-York e no Rio e em Buenos Aires:
quando chega ao mar vai nos navios,
cria seus lodos em garrafeiras velhas,
desemboca nos clubes e nos bars.
O Douro é um rio de barcos
onde remam os barqueiros suas desgraças,
primeiro se afundam em terra as suas vidas
que no rio se afundam as barcaças.
Nas sobremesas finas, as garrafas
assemelham cristais cheios de rubis,
em Cape-Town, em Sidney, em Paris,
tem um sabor generoso e fino
o sangue que dos cais exportamos em barris.
As margens do Douro são penedos
fecundados de sangue e amarguras
onde cava o meu povo as vinhas
como quem abre as próprias sepulturas:
nos entrepostos dos cais, em armazéns,
comerciantes trocam por esterlino
o vinho que é o sangue dos seus corpos,
moeda pobre que são os seus destinos.
Em Londres os lords e em Paris os snobs,
no Cabo e no Rio os fazendeiros ricos
acham no Porto um sabor divino,
mas a nós só nos sabe, só nos sabe,
à tristeza infinita de um destino.
O rio Douro é um rio de sangue,
por onde o sangue do meu povo corre.
Meu povo, liberta-te, liberta-te!,
Liberta-te, meu povo! – ou morre.
sábado, 6 de junho de 2009
JOAQUIM Vitorino NAMORADO (1914-1986)
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